segunda-feira, outubro 30, 2006

Monólogo em pouca água





é mentira a palavra
é mentira a forma

é mentira o desejo antecipado na noite
é mentira a garganta em forma de tosse
é mentira a posse

é mentira o suspiro na morte consolado
é mentira o bocado

é mentira a voz no sussurro do desejo
é mentira o beijo

é mentira a puta
é mentira à bruta

é mentira a flor em forma de hortelã
é mentira a cama e a manhã
é mentira a vida
e mentira é a sorte
é mentira tudo
na verdade da morte
e mentira somos
pois de mentira fomos
em mentirosas noites

feitos

é mentira a água a cair da árvore

é mentira o mar
é mentira o ar
é mentira a música
é mentira a arte

é mentira amar-te

é mentira ser
é mentira ter
no lado de dentro

da mão
a tua linha

a minha

é mentira a tardinha

e mentira é a luz

e os teus olhos também

é mentira

a
mentira

a mentira
e ninguém

é mentira o gemido
é mentira o colchão
é mentira o poema
e o joelho na mão
é mentira o segredo
é mentira o papão

e mentira somos nós

única mentira
em forma de poema

e é mentira a pena

e mentira é estar aqui
à espera
das mentiras que dirão

pois então

e se tudo é mentira
que se foda a razão.








domingo, outubro 29, 2006

sábado, outubro 28, 2006

Coisas




(...)E não sei se é este o significado das coisas, quando
as digo, ou o sentido das palavras, quando me
indicam o caminho para o outro lado das coisas.


Nuno Júdice - As Coisas Mais Simples

quarta-feira, outubro 25, 2006

Sentidos








Fala-me do copo. Enche-me o sentido.
Dá-me o motivo.

domingo, outubro 22, 2006

Eu Brindo







Brindo aos artistas
aos que se deixaram ir por entre as
tempestades
e aos que ficaram por entre nódoas de
libertinagem cega e desatinadas.
Brindo ao ócio dos poetas
e ao desencanto das madrugadas atoladas
em cheiros de memórias secas.
Brindo aos outros que não são mais
do que outros e que de outros vivem
por que sim
por que querem
ou por que não sabem de mais nada.
Brindo aos copos que se bebem
e se vomitam minutos depois
na náusea do fogo que não sabe
a mais nada a não ser a lenha
queimada
a escapar-se por entre delírios
deliciosamente
perversos.
Brindo ao hálito das nuvens que transformam
a pouca capacidade dos dias em chuvas
torrenciais a amargarem-nos ainda mais
a existência atroz de cabelos em pé .
Brindo aos museus e aos Picassos e aos Mirós e aos outros
que nos parecem querer enviar poemas pintados de água sólida
quando o copo está meio-cheio.
Brindo à marcha-fúnebre do Chopin que coisa mais linda não há
e ao Ashkenazy que o levou nos dedos até um piano qualquer
não importa onde nem de quem.
Brindo à filha da puta de vida que nos deram
para enevoar esquinas e nos
foder os nós na garganta
seca
estremunhada .
Brindo aos dias que não são mais que penosos pequenos
contraditórios aumentos de dor.
Brindo ao Férré e ao outro que não me lembro agora do nome e aos poetas malditos
que de tão malditos nos abençoam a puta da existência .
Brindo aos livros que não li e aos bares que não frequentei
e aos poetas que detesto e aos deslumbres.
Brindo ao desassossego do bernardo soares que me puxa pela mão
todos os dias e me leva para onde não há mais nada
a não ser desejos desfeitos e desiquilibradas forças.
Brindo ao som do violoncelo do Yo-Yo Ma que me desfaz por dentro
qualquer tipo de dúvida e me amachuca os olhos
a rasar a lágrima e a chamar por mim.
Brindo aos cantos.
Brindo aos vícios que me agarram tão fiel aos princípios de vida
real
insinuante
voadora.
Brindo aos bocados.
Brindo aos pedaços.
Brindo à morte que me ensina o caminho dos segredos
que se desfazem em ópio e segmentos de sussurros.
Brindo ao impotente desejo de amar o desespero até
cair para o lado.
Brindo aos infiéis.
Brindo aos loucos.
Brindo aos poucos.
Brindo às cordas dos enforcados que se reviram em mil formas
e desistem de ter o pé no chão.
Brindo ao fim da raiva que nos aperta na garganta
o nó da lágrima.
Brindo às páginas do livro que leio assustada com o fim.
Brindo a ti.
Brindo a mim.
Brindo por que
sim.

Diálogo assim-assim

- tenho que dizer porque não há nada para além da água.
- mas é uma mesa...
- não viste o pássaro?!... estava por lá, fora do ninho...
- não tinha asas...
- mas era pássaro...
- sem asas?!...
- mesmo!
- eras capaz de voar?
- sim...

sexta-feira, outubro 20, 2006

Sombra(s) Plural(ais)


________ deixo que me digas. ai as mãos. insatisfeitas sempre na verdade da pele
...... deixo que me fales. ai os dedos
magros de hálito quente a aconchegar a manhã___________
à manhã. amanhã. há manhã. ----------- e enquanto respiras
fumo o teu segredo________
nosso
cobertor de mãos nas palmas dos sonhos
_________ deixa que a manhã seja

o assombro das noites

sempre

quarta-feira, outubro 18, 2006

Sombras



Trabalho o poema sobre uma hipótese: o amor
que se despeja no copo da vida, até meio, como se
o pudéssemos beber de um trago. No fundo,
como o vinho turvo, deixa um gosto amargo na
boca. Pergunto onde está a transparência do
vidro, a pureza do líquido inicial, a energia
de quem procura esvaziar a garrafa; e a resposta
são estes cacos que nos cortam as mãos, a mesa
da alma suja de restos, palavras espalhadas
num cansaço de sentidos. Volto, então, à primeira
hipótese. O amor. Mas sem o gastar de uma vez,
esperando que o tempo encha o copo até cima,
para que o possa erguer à luz do teu corpo
e veja, através dele, o teu rosto inteiro.

Nuno Júdice

terça-feira, outubro 17, 2006

O Tejo



O Tejo está castanho!

Aquilo é o Tejo?!

Não! É uma fonte!...

Castanha, a água?!

Não, a fonte...

Ah!...

segunda-feira, outubro 16, 2006

Mullova





"Viktoria Mullova may be the most elegant, refined and sweetly expressive violinist on the planet"
The Chicago Tribune

Viktoria Mullova is an internationally acclaimed artist who studied at the Central Music School of Moscow and at the Moscow Conservatoire. Her extraordinary talent captured international attention when she won first prize at the 1980 Sibelius Competition in Helsinki and the Gold Medal at the Tchaikovsky Competition in 1982. Since then, she has appeared with most of the world's greatest orchestras and conductors and at the major international festivals. Viktoria plays on her ‘Jules Falk’ 1723 Stradivarius.
A passion for the Baroque repertoire and a period approach to playing, which she has nurtured since 2000 (performing and touring throughout the world with the Orchestra of the Age of Enlightenment and Il Giardino Armonico), sees Mullova playing on authentic instruments with these groups.
Mullova’s ventures into creative contemporary music, which started in 2000 with her album “Through the Looking Glass” (with the renowned British jazz pianist Julian Joseph - “…Mullova and friends transcended their contrasting musical origins and fused into something genuinely new and beguiling.” - Richard Morrison, The Times), continues with specially commissioned works from young composers such as Dave Maric (premiered with Katia Labèque at the 2002 City of London Festival and on tour throughout Europe) and Fraser Trainer (premiered with the experimental ensemble Between the Notes at the 2003 City of London Festival). She continues to develop these relationships and premiered a new work for the BBC Proms in July 2005 by Fraser Trainer.
With a group of like-minded musicians she formed the Mullova Ensemble, which first toured in July 1994. The Ensemble have since recorded two discs (Bach Concertos and Schubert Octet) and continue to tour throughout Europe, their unique blend of scholarship and musicianship and their ability to breathe life into music new and old appreciated by audience and critics alike.
As a recitalist, Mullova performs regularly with Katia Labèque. She also plays Bach programmes on gut strings , either with the harpsichordist Ottavio Dantone or purely solo; “ To hear Mullova play Bach is, simply, one of the greatest things you can experience…”Tim Ashley, The Guardian.
Her discography for Philips Classics has attracted many prestigious awards. In 2005 Mullova once again explored new territories and has teamed up with the newly formed Onyx Classics label to present a series of new recordings. The debut recording is a Vivaldi Concertos programme with Il Giardino Armonico directed by Giovanni Antonini, which won the coveted Diapason D’Or of the year award for 2005.
September 2005



Tocou na Gulbenkian na passada 6ª feira. Sublime!!!

domingo, outubro 15, 2006

Diálogo bem passado


- Estaria a fotografar no chão?
- Capaz disso era ela! Pobre de espírito como é... Imagine-se... Ainda por cima de noite!
- De noite?!... Como sabes isso?
- Vê-se... Eu vejo tudo... Sei tudo...
- Ela explicou-te?! Disse-te?
- Não é necessário, eu sei!
- A imagem pode ser, por si só, enganadora...
- Imagem é imagem!
- Isso importa mais que o aperto na garganta?
- Desaperta-se!
- E... a noite?
- Foi bem passada!

Os bifes também, embora eu os prefira em sangue...

sexta-feira, outubro 13, 2006

Isqueiro


Acabou-se o gás do isqueiro.
Só tenho fósforos...

quinta-feira, outubro 12, 2006

Yo-Yo Ma




"The Silk Road Ensemble - Silk Road Journeys: Beyond the Horizon"


Yo-Yo Ma é um homem que me fascina até mais não. Andou pelo mundo a procurar músicos, a aprender-lhes os gestos, a decifrar-lhes o som. Tem 50 anos e toca violoncelo há 46. Este trabalho é um dos melhores contributos para a história da música mundial. Imperdível!

quarta-feira, outubro 11, 2006

Janelas


A janela está aberta?! Qual janela? Conseguem ver alguma coisa?!... Só vejo mesas vazias à espera de sonhos...

Que se lixem as janelas!!!!!!............

terça-feira, outubro 10, 2006

O gato


Tímida a luz aparece na esquina e disfarça-se de candeeiro. Há por aí, algures, um gato à espera de comida...
- Sabes que mais? Quero lá saber dos cães!
- Pode ser um gato, não me importo....
- Afinal em que ficamos?!....
- De noite, são pardos todos os gatos...
- Que côr é essa?!...
- Ora, inventa!...
O candeeiro disfarçou-se de esquina - é a lua!

domingo, outubro 08, 2006

Entre medos...


..." o medo mata, quer matar. O medo é destrutivo; o amor é uma energia criativa.Quando ama apetece-lhe criar - talvez queira cantar uma canção, ou pintar, ou escrever poesia, mas não vai querer pegar numa baioneta ou numa bomba atómica para ir a correr como um louco matar pessoas que lhe são absolutamente desconhecidas, que não fizeram nada, que são tão desconhecidas para si como você para elas.
O mundo só abandonará as guerras quando o amor entrar novamente no mundo. Os políticos não querem que ame, a sociedade não quer que ame, a família não deixa que ame. Todos eles querem controlar a energia do seu amor porque ela é a única energia que existe. É por isso que existe o medo.
Se me compreender, abandone todos os medos e ame mais - e ame incondicionalmente. Não pense que está a fazer alguma coisa pelo outro quando ama; está a fazer alguma coisa por si próprio. Quando ama isso é benéfico para si. Portanto, não fique à espera; não diga que amará quando os outros amarem - a questão não é, de maneira nenhuma, essa.
Seja egoísta. Ame as pessoas - sentir-se-á realizado através desse amor, obterá cada vez mais bençãos através desse amor.
E quando o amor for mais profundo, o medo desaparecerá; o amor é a luz, o medo é a escuridão."...

Osho

sábado, outubro 07, 2006

Clave

Na Igualdade da Torrente

Na igualdade da torrente, uma só árvore,
palavras e pedras acolhendo
uma cabeça ao ritmo das vagas,
e uma sombra oval sobre as espáduas,
respirando lentamente o ar redondo,
os reflexos nos ramos, semelhanças
de um sopro, os anéis do dia,
sem fim nem centro a inacabada arca
que sobre o mar, errante, é a permanência.

Acordes

António Ramos Rosa

sexta-feira, outubro 06, 2006

Diálogo, talvez...



Modigliani - Reclining Nude

De cada vez que espreito, a janela está entreaberta... Será que não dás por isso?!... O frio, sim, o frio, haverá alguma outra justificação? Se não souberes, não digas, que eu já não me importo com as fechaduras. Fecha ou abre, é indiferente. A sensação é a mesma, ou seja, nenhuma. Tenho que ler tudo isso, tenho sim senhora. A dificuldade está em segurar o livro. Tenho a impressão que se separou das folhas, das palavras. Não se alinham em pensamento. Mas também não tem importância. O pensamento é só mais uma coisa que não serve para nada.

quinta-feira, outubro 05, 2006

Pedro Almodovar



"...os fantasmas não choram." Carmen Maura no filme Volver

quarta-feira, outubro 04, 2006

Brutal...



Yo-Yo Ma e um Stradivarius, Piazolla, Tango, Argentina... Vamos?!...

terça-feira, outubro 03, 2006

Naturträne



Nina Hagen, numa fantástica homenagem à natureza!

Falando de amor...



..."Você só conhece uma espécie de amor que é odiar os outros. Só consegue mostrar o amor que tem pelo seu país odiando outros países, e só consegue demonstrar o amor que tem pela sua igreja odiando as outras igrejas. Está metido numa grande confusão! E essas assim-chamadas religiões continuam a falar-lhe de amor, mas tudo o que fazem neste mundo é criar cada vez mais ódio. Os cristãos falam de amor mas têm provocado guerra e cruzadas. Os muçulmanos falam de amor, mas criam as jihads. Os hindus falam de amor, mas pode-se ver as suas escrituras - estão cheias de ódio, de ódio pelas outras religiões. E nós aceitamos todos estes disparates!...O amor foi envenenado mas não foi destruído."...

Osho

segunda-feira, outubro 02, 2006

Jack Kerouac




On The Road (excerpt)

'... one night we suddenly went mad together again; we went to see Slim Gaillard in a little Frisco nightclub. Slim Gaillard is a tall, thin Negro with big sad eyes who's always saying 'Right-orooni' and 'How 'bout a little bourbon-arooni.' In Frisco great eager crowds of young semi-intellectuals sat at his feet and listened to him on the piano, guitar and bongo drums. When he gets warmed up he takes off his undershirt and really goes. He does and says anything that comes into his head. He'll sing 'Cement Mixer, Put-ti Put-ti' and suddenly slow down the beat and brood over his bongos with fingertips barely tapping the skin as everybody leans forward breathlessly to hear; you think he'll do this for a minute or so, but he goes right on, for as long as an hour, making an imperceptible little noise with the tips of his fingernails, smaller and smaller all the time till you can't hear it any more and sounds of traffic come in the open door. Then he slowly gets up and takes the mike and says, very slowly, 'Great-orooni ... fine-ovauti ... hello-orooni ... bourbon-orooni ... all-orooni ... how are the boys in the front row making out with their girls-orooni ... orooni ... vauti ... oroonirooni ..." He keeps this up for fifteen minutes, his voice getting softer and softer till you can't hear. His great sad eyes scan the audience.

Dean stands in the back, saying, 'God! Yes!' -- and clasping his hands in prayer and sweating. 'Sal, Slim knows time, he knows time.' Slim sits down at the piano and hits two notes, two C's, then two more, then one, then two, and suddenly the big burly bass-player wakes up from a reverie and realizes Slim is playing 'C-Jam Blues' and he slugs in his big forefinger on the string and the big booming beat begins and everybody starts rocking and Slim looks just as sad as ever, and they blow jazz for half an hour, and then Slim goes mad and grabs the bongos and plays tremendous rapid Cubana beats and yells crazy things in Spanish, in Arabic, in Peruvian dialect, in Egyptian, in every language he knows, and he knows innumerable languages. Finally the set is over; each set takes two hours. Slim Gaillard goes and stands against a post, looking sadly over everybody's head as people come to talk to him. A bourbon is slipped into his hand. 'Bourbon-orooni -- thank-you-ovauti ...' Nobody knows where Slim Gaillard is. Dean once had a dream that he was having a baby and his belly was all bloated up blue as he lay on the grass of a California hospital. Under a tree, with a group of colored men, sat Slim Gaillard. Dean turned despairing eyes of a mother to him. Slim said, 'There you go-orooni.' Now Dean approached him, he approached his God; he thought Slim was God; he shuffled and bowed in front of him and asked him to join us. 'Right-orooni,' says Slim; he'll join anybody but won't guarantee to be there with you in spirit. Dean got a table, bought drinks, and sat stiffly in front of Slim. Slim dreamed over his head. Every time Slim said, 'Orooni,' Dean said 'Yes!' I sat there with these two madmen. Nothing happened. To Slim Gaillard the whole world was just one big orooni."...

domingo, outubro 01, 2006

Mares


Não lhe chamem incerteza - chamem-lhe magia.

Não lhe chamem insegurança - chamem-lhe liberdade.

Osho


Parabéns, Mãe!